Eu nunca quis ser astronauta. Sempre quis começar um
texto assim, mas nunca encontrava onde encaixar essa frase. Esse papo de sempre
dizerem que toda criança já quis ser astronauta é mentira. Tá, beleza, deve ser
super legal a viagem até a lua, flutuar e tal, mas e quando eu chegar lá ? O
que é que eu vou fazer? Sou hiperativa e ansiosa demais pra ser astronauta.
Além do mais, esses dias vi um quadrinho onde mostrava dois astronautas e um
deles estava com coceira no nariz. Consegue imaginar o desespero? E é claro que
ia dar sim uma coceira no nariz porque coceiras sempre dão nas horas erradas,
tipo na missa na hora do pai nosso comunitário. Esqueça alergias, ataques de
pernilongos, pó de mico o que dá mesmo coceira é não poder coçar.
Quando era criança quis fazer moda porque achava que
criava modelos de vestidos incríveis com a toalha de banho. Já quis
também ser cabeleireira e me frustrei logo no primeiro corte, fui obrigada a
desistir do meu sonho depois de transformar meu lindo cabelinho em uma réplica
perfeita de capacete. Já quis ser advogada porque sempre gostei de argumentar
para defender meu ponto de vista e porque inventava contratos para meu pai
assinar e me dar as coisas que prometia. Já quis ser tanta coisa que já
quis, inclusive, não ser nada o que foi realmente o mais desesperador.
Um dos meus sonhos infantis era trabalhar na rádio.
Primeiro porque eu achava muito importante falar algo para muita gente ouvir.
Achava tão importante que cheguei a ligar na rádio, pedir música e gravar
aquilo pra ouvir depois e mostrar para a família como se fosse a coisa mais
importante do mundo, como se só pessoas muito privilegiadas pudessem ligar lá
para falar ao vivo. O motivo principal de querer trabalhar na rádio é porque eu
tinha uma grande inveja do locutor. Gente, o cara da rádio parece ter a vida
perfeita, são 7h da manhã você está quase morrendo de sono, indo cumprir suas
obrigações e ele ta lá, naquela animação. Meio dia, aquela fome do cão e ele
continua na mesma animação. Eu pensava que o cara da rádio era a pessoa
mais feliz do mundo, sempre animado e jovial. É por isso que esse foi por muito
tempo o emprego dos meus sonhos. Eu cheguei a trabalhar na rádio, realizei meu
sonho. Também paguei muito mico, chamei gente importante pelo nome errado,
tirei o locutor ao vivo, dei uma de surda e sou zuada até hoje quando lembram
dessas gafes. Foi uma super experiência, é o tipo de coisa que você só aprende
na prática e errando muito mesmo. Descobri que o locutor da rádio não é a
pessoa feliz 24h por dia, mas se ele ama aquilo que faz consegue fingir muito
bem.
Depois descobri que eu gostava de escrever apesar de
sempre ter ido tão mal em redação. Eu não queria escrever sobre o derretimento
das calotas polares, os países emergentes ou o sistema de cotas em
universidades. Queria escrever sobre aquilo que realmente importava na minha
vida como a minha relação com meus avós, um causo de infância ou algo que
aprendi com a vida. Até hoje quero ser um monte de coisa. Cada hora uma
coisa. Meu sonho mesmo é ir no programa do Jô dar entrevista, acho que é o
máximo uma pessoa conseguir ir lá, quer dizer que é realmente boa naquilo que
faz. Meu outro sonho é um dia chegar lá. Lá é aquele lugar que todo mundo tanto fala
que quer chegar. Meu problema nem é saber onde é lá. Meu problema é que o meu lá vive em constante
mutação então nunca sei se um dia chegarei nele.
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