Era um homem comum, morava em uma casa simples no fim da Rua Maria Antonieta em uma cidade interiorana de Minas Gerais. Dizem que era honesto gentil e possuía um ótimo caráter. Era o melhor em sua profissão. Mas tinha um problema desconhecido por todos. Era absurdamente curioso.


Se curiosidade fosse proibido estariam todos os seres humanos ferrados. Já tentaram diminuir esse problema e mataram gente inocente para servir de exemplo. A curiosidade matou o gato, de nada adiantou. Ninguém deixou de possuí-la por isso e coitado do gato que nada fez. Enfim, a curiosidade não seria um diferencial para o homem se não fosse exagerada, quase impossível de se conter. Foi também ela fator fundamental para a escolha de sua profissão. Seu nome era Nestor.

Nestor queria saber da vida de todos e não queria demonstrar isso. Tinha receio de ficar com fama de fofoqueiro, o que seria realmente uma grande injustiça. Queria saber apenas, não divulgar. Ficava boa parte de seu tempo observando as pessoas e sonhava em descobrir o que se passava na cabeça de cada uma delas. Tinha curiosidade também em descobrir pequenas coisas que mais ninguém notava como o motivo de Magnólia chegar mais tarde em casa às terças feiras ou da filha do padeiro parecer sempre tão triste. Não saber lhe corroia por dentro. Só quando descobrisse todas as coisas a respeito de todos na cidade poderia viver em paz.

Sem que todos jamais desconfiassem o senhor tinha a vida deles em suas mãos. Faltava malicia aos habitantes daquela pacata cidade. Nestor foi uma criança genial, nasceu curioso e por isso se pôs desde pequeno a pensar em um modo de se satisfazer. Foi assim, que teve a brilhante idéia que mudaria sua vida para sempre, seria chaveiro. Começaria o mais breve que pudesse e assim poderia um dia possuir a cópia de todas as chaves da cidade. Não daria inicio ao seu plano enquanto não as tivesse, era uma questão de cautela. Se algo por um acaso desse errado, perderia a credibilidade e seu plano iria por água abaixo.

Foi em uma tardezinha, do mês de outubro que o curioso se deu conta que sua coleção estava finalmente completa. Podia então começar a colocar seu plano em prática e o fez. Escolheu Magnólia como sua primeira vítima e sabia muito bem que chegava mais tarde às terças. Era segunda feira, não poderia ser mais perfeito.

Esperou ela sair de casa, aproveitou a calmaria da rua e entrou na casa, na maior naturalidade, como se lá morasse. O sobrado tinha cheiro de mofo, logo na sala de visitas havia uma mesinha com uma enorme quantidade de porta retratos do falecido marido. Nestor sentiu pena e por um momento pensou em desistir da idéia, mas não o fez. Continuou, subiu as escadas, passou por um longo corredor e chegou ao quarto da idosa que ficava ao final.

Havia várias roupas de festa jogadas sobre a cama. O pó de arroz e o perfume sobre a penteadeira ainda estava destampados. Foi quando o senhor observou o objeto que seria a pista perfeita. Estava sobre a cômoda, tinha uma bela capa caramelo de couro, era a agenda de Magnólia. Tratou logo de abri-la e se pôs desesperadamente a procurar alguma pista. Não foi difícil, estava lá em todas as terças feiras o mesmo compromisso marcado em caneta azul. Encontro com Frei José.

Nestor não acreditava no que estava lendo. Em um primeiro momento ficou sem reação, imóvel,mas depois riu, riu muito, até a barriga doer e ter que deitar na cama para rolar de rir literalmente. Seu riso foi interrompido pela porta que bateu bruscamente. Olhou o velho relógio sobre o criado mudo e viu que ainda era cedo, algo devia ter ocorrido. Não importava, precisava se esconder. Lembrou-se de novelas que tinha assistido e se escondeu em baixo da cama, pois o armário seria mais arriscado. Os passinhos se aproximavam cada vez mais, passos miúdos e ligeiros. Magnólia entrou no quarto.

Momentos de tensão são sementes para grandes ataques de riso, e foi o que ocorreu. Após imaginar a idosa e o padre nas mais constrangedoras situações ele não agüentou e o riso veio à tona. Ria muito e se sentia culpado por isso. A senhora gritou e ameaçou chamar a polícia. Foi nesse momento que Nestor fez algo que não era de seu feitio, não estava nos planos. Saiu debaixo da cama e disse decidido. Pra que chamar a polícia, chame Frei José, Dona Magnólia.

A viúva ficou branca, suas pernas bambas, se sentou na cama e lá ficou sem reação. Ele aproveitou do momento e saiu de fininho pela porta. No outro dia recebeu uma carta. O chaveiro era agora herdeiro universal não só de todos os bens da querida Magnólia como também do respeitado Frei José.

4 comentários:

Anônimo disse...

isso vei da sua "cabeça" ou de um livro?...muito bem escrito!

Laiz Araújo disse...

Tudo que está escrito no blog vem da minha cabeça. Não copio de nenhum lugar não.

Carolina disse...

Laiz, já te disse pra me dar um pouco dessa criatividade bem! haha

Priscila disse...

Adorei, Laizinha!
Muiiito boom!